Eu estava vendo um álbum de fotos e ali encontrei uma foto do tempo que eu estudava no antigo "ginásio", hoje o ensino fundamental, a foto olhou olhou prá mim ela disse :
- E ai Dió, você se lembra desses tempos, bons tempos né?
É, talvez tenha sido bons tempos, porque pela idade que eu tinha, eu não tinha muita noção das coisas, das dificuldades que a minha família passava, prá mim tudo era festa e alegria, tenho muitas lembranças dessa época.
É curioso como as coisas e comportamentos se transformam com o passar dos anos, no meio dos anos 70 eu era um garoto cheio de ideais e sonhos, era o período do sexo, drogas e rock and roll, sexo eu começava a descobrir, era e sou amante de rock, mas drogas nunca foi minha praia, nunca precisei delas, pois sempre tive personalidade e nunca necessitei de artifícios para mudar meu comportamento, porque sei que no fim, com elas, as coisas nunca acabam bem.
Tá certo que algumas vezes eu chegava em casa babando, quando eu queria relaxar, esquecer um pouco os problemas, tomava todas, o efeito era um porre e dores de cabeça, nada mais sério, eu nunca fui alcoólatra, sabia controlar as coisas.
Naquela época já existiam os tais "nóias", eram os temidos e indesejados maconheiros, essa era a droga mais usada e consumida.
Quando eu vinha de madrugada para casa do salão aonde me divertia e "fazia as baladas", e ganhava prá isso, na época eram os chamados bailes, sempre encontrava os "maria-fumaça", como eram conhecidos os caras, eram dois personagens que nas madrugadas passavam a noite a circular e “fumar“ maconha em volta do quarteirão da escola aonde eu estudava, ela ficava localizada no bairro da Vila Aricanduva, perto do metro Penha, na zona leste de São Paulo, aqui na capital.
Os caras passavam a noite circulando e fumando maconha em volta do quarteirão, eles eram peças conhecidas na época, eu só cumprimentava os dois e seguia meu caminho, era meio perigoso ter envolvimento com eles, principalmente por ser um período de chumbo, o período da ditadura, aonde o pais era dirigido com mãos de "ferro".
Perto de casa, também morava um cara de apelido “barril”, ele só andava com mulher gostosa, depois fui saber que eram prostitutas, o cara era barra pesada, parece que era envolvido com drogas, cafetão, não sei bem, sei que tempos depois ele desapareceu.
Como o sexo naquela época era livre e as coisas para os meninos aconteciam bem mais cedo que hoje, você geralmente só pensava com uma cabeça, a de baixo.
Quem morava no pedaço era gente de classe média baixa, naqueles período, existiam dois tipos de salões de baile, (as tais baladas hoje!).
Um com a entrada com os preços mais caro e que todos gostavam de frequentar para fazer uma média, ali tudo era mais caro, era frequentado pelas maria-gasolina, as garotas que só gostavam de sair com quem tinha carro ou moto, gostavam de dar uma de “difícil”, tudo naquela de entrou "comeu", ou dá ou desce, já ouviu falar disso? A coisa era assim, e o coitado sem grana nem carro, não "comia" ninguém !
Agora o outro salão, o menor, aonde tudo era mais barato, a coisa com a mulherada, ali era mais fácil, esse salão era frequentado pela turma barra pesada, as meninas que frequentavam esse salão eram as “barangas”, também eram as mais fáceis de se arranjar e transar, e era esse que eu gostava de frequentar, principalmente por estar em uma idade em que a cabeça que pensava era a de baixo e depois eu também nunca fui muito "lindinho" e ai "juntava a fome com a vontade de comer".
As seleções musicais tinham seis musicas intercaladas, seis lentas e depois seis dançantes, até o fim da balada, quem não conseguir convencer uma menina para sair depois de seis musicas dançando coladinho e agarradinho e falando na orelha, tinha que se matar, essas seleções demoravam em média vinte minutos, e em vinte minutos muita coisa acontecia e eu mesmo dançando quase sempre me dava mal, essas seleções lentas eram conhecidas por “mela cueca” isso porque você ficava coladinho na menina todo esse tempo se esfregando e imagina o resultado, esse era o tal do mela cueca.
Num desses sábados depois de uma dança, consegui convencer uma menina a levar ela para casa, ela era muito mais velha que eu, mas ali dava de tudo e para transar só com as mais velhas.
Levar para casa naquela época era meio caminho andado para uma transa, como eu vivia sem dinheiro o que poderia fazer? Com certeza na seca que eu estava, algum paredão era motel de luxo, ou quem sabe algum terreno baldio, naquela época o perigo de assaltos e violências eram bem menores, as pessoas geralmente se conheciam, e os bairros não eram tão populosos como hoje.
Naqueles tempos, tinham as turmas da pesada, e eu pertencia a um desses grupos, os da rua de baixo, tinha também o grupo da rua de cima e o grupo que morava do outro lado do rio.
Para você se proteger quando ia as baladas da época, geralmente você andava em bandos, eu pertencia ao grupo maior e estava sempre do lado dos “chefes” dos cabeças do meu grupo que eram dois caras os mais fortes e mal encarados, para você ter uma ideia, o Marcão, um dos chefes do grupo tinha 2,05 de altura, o pé do cara parecia um L, nas situação de risco, eles estavam sempre a frente das encrencas, como eu não era bobo deixava todos me verem do lado deles, eu era respeitado e tinham medo de mim, mal sabiam eles que eu fazia aquilo como forma de proteção, ficava do lado deles só na paz, isso não era covardia era sobrevivência.
Eu conhecia meu bairro e todos os bairros em volta, cada rua, cada canto, quem morava em cada casa, eu tinha contato com a turma de todas as "gangs".
Em um belo dia, eu estava na seca, a meses sem transar, "ganhei" uma garota no baile, papo vem, papo vai, consegui convencer ela a entrar em um terreno baldio para uma transa, a rua era escura, o terreno tinha um pedaço do muro quebrado de fácil acesso e foi para lá que eu fui, parece absurdo, mas na época, paredão e terreno baldio era motel de luxo.
Agarra aqui, aperta ali, de pé, sem jeito, não dava, estava muito ruim, foi na hora que olhei para o lado e vi um banco de Kombi abandonado e não pensei duas vezes, joguei minha jaqueta LEE, a marca de jaqueta que era o top da moda da época em cima do banco e foi ali mesmo.
Com a idade de 15 anos a coisa aconteceu mais ou menos assim : - Tá bom não tava?
Rápido que nem coelho, mas, para mim era a glória, depois do fato consumado, saímos do terreno discretamente e como ela morava a um quarteirão dali, deixei ela na esquina da casa dela e voltei eufórico e alegre a caminho de casa, me sentindo o Long Dong Silver, conhece, procure saber quem foi esse cara, vai se espantar.
Uma coisa começou a me incomodar foi o cheiro de merda que me seguia, esperei chegar em um quarteirão mais a frente pois era mais iluminado, eu iria olhar embaixo dos sapatos, imagine a iluminação publica em um bairro da periferia nos meados dos anos 70.
Embaixo da luz olhei e nada no sapato, de onde viria aquele cheiro de merda?, segui em frente, logo estaria em casa, mesmo sendo de madrugada, daria uma desculpa para minha mãe e diria que iria tomar banho por causa que caiu bebida na roupa sei lá.
Aquele cheiro me seguia e estava me incomodando muito, coloquei a chave na fechadura, abri a porta e dou de cara com a minha mãe ainda acordada assistindo televisão, comentei com ela do cheiro de merda que eu estava sentindo, ela se levantou se aproximou de mim, olhou de um lado, de outro, me olhou com cara de um misto de raiva e ironia, colocou a mão em meu ombro, olhou em meus olhos e disse :
- Acho bom você ir correndo tomar um banho, mas antes me explique, aonde você deitou que as costas da jaqueta esta cheia de merda ?
Antes de ir quero deixar esta prá você pensar :
